A concisão de Schopenhauer
 



Dica de Escrita

A concisão de Schopenhauer

Emilly Garcia


A concisão é um tema recorrente na literatura. Em narrativas longas e, principalmente, nas curtas, autores e teóricos são taxativos na defesa de textos que primam pelo essencial, o famoso "menos é mais". Edgar Allan Poe, Julio Cortázar, Ernest Hemingway e sua teoria do iceberg, apenas para citar alguns nomes.


Outro pensador geralmente ligado ao conceito de concisão é o filósofo polaco-alemão, Arthur Schopenhauer (1788-1860). No livro "A arte de escrever" (Editora L&PM, 2017) o autor assume uma postura extremamente crítica e questionadora para construir suas ideias sobre erudição, escrita, os tipos de escritores, e ainda linguagem e tradução. Seu modo de pensar influenciou ninguém menos que Sigmund Freud e Friedrich Nietzsche.

"A arte de escrever" é uma compilação de ensaios da "Parerga e Paralipomena" (1851), uma das obras mais importantes de Schopenhauer. No capítulo "Sobre a escrita e o estilo" (p. 55-125) é onde o autor disserta sobre a concisão, mostrando-se contra todo tipo de prolixidade. Para ele, "é sempre melhor deixar de lado algo bom do que incluir algo insignificante".
A autêntica concisão da expressão consiste em dizer apenas, em todos os casos, o que é digno de ser dito, com a justa distinção entre o que é necessário e o que é supérfluo, evitando todas as explicações prolixas sobre coisas que qualquer um pode pensar por si mesmo. Em contrapartida, nunca se deve sacrificar à concisão a clareza, muito menos a gramática".
A última frase do trecho acima, contudo, indica que suprimir informações importantes para o entendimento da narrativa pode interferir na clareza do texto literário. Percebe-se uma preocupação com a recepção do leitor. Portanto, equilíbrio parece ser a palavra-chave.

Marcelo Spalding aponta para algo semelhante em seu livro "Minicontos" (Editora Metamorfose, 2018, p. 10). Ele diz que:
"Ser breve e ser conciso são coisas diferentes. (...) Não se pode atrofiar uma narrativa, tampouco espichá-la".
Retomando Schopenhauer, o filósofo defende ainda que a erudição seria uma forma de compensar algum tipo de falta. Assim, um texto escrito com a pretensão de ser erudito tende a apresentar floreios, frases longas e adjetivos em demasia.
"(...) sem dúvida, muitos escritores procuram esconder sua pobreza de pensamento justamente sob uma profusão de palavras".
E ele vai além comparando a erudição e a prolixidade a um sintoma de mediocridade.
"Usar muitas palavras para comunicar poucos pensamentos é sempre o sinal inconfundível da mediocridade; em contrapartida, o sinal de uma cabeça eminente é resumir muitos pensamentos em poucas palavras".
Em um primeiro momento, talvez as críticas contundentes de Schopenhauer causem desconforto a alguns escritores, mas, certamente, seus escritos podem nos ajudar a refletir sobre como estamos conduzindo a nossa escrita criativa. Será que estamos sendo estrategicamente concisos ou ainda tentamos reproduzir um estilo de escrita dos cânones do século passado? Para quem escrevemos?

Vale ressaltar que a pós-modernidade e os anseios do leitor contemporâneo demandam um texto fluido e conciso. O surgimento de estilo literários como o miniconto e narrativas curtas de autoficção ilustram perfeitamente essa tendência. Quanto a Schopenhauer, ainda que partes de seu discurso tenham sido revisitadas por teóricos e críticos literários posteriores, é indiscutível sua contribuição para a reflexão em torno da concisão na literatura.

 

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